7 de fevereiro de 2017

A vida prega-nos destas ...


Porque nunca mais publiquei nada no meu blogue. A vida prega-nos destas ...

Outubro de 2015
Estava a meio de um período emocionalmente muito conturbado, devido a questões familiares. E pessoalmente vinha duma luta de quase dez anos, dez anos a lutar para manter a cabeça à tona da água. Dois caroços no pescoço, já de tamanho considerável e duros. A médica do centro de saúde ignorou. Perante o meu ar preocupado até pareceu ficar ofendida como se eu estivesse a por em causa os seus doutos conhecimentos. O tempo passou, Novembro, Dezembro … e eu com situações tão complicadas a resolver, deixei passar também.

Janeiro de 2016
O desenlace do período emocional. Tudo termina. Passa Fevereiro, e em Março começo com umas dores de cabeça lancinantes, tensão alta. Não estava bem mas continuava a ter de resolver mais situações de outras pessoas. Exames, exames e nada se descobria.

Abril de 2016
Faço uma ecografia ao pescoço em final de Abril. Presença de adenopatias mas às quais o médico não achou relevância. Disse-me para ir fazendo o controle. Maio de 2016 A médica envia-me para medicina interna, um mês depois tenho consulta. Tac ao pescoço com contraste. Perguntei à técnica se se sabia logo se era maligno ou não. Disse-me que sim. No fim do exame perguntei-lhe e vi no rosto dela que era, embora ela me tenha dito que não via nada.

Junho de 2016
Entre consultas adiadas pela falta do médico, greves, no final de Julho tinha consulta que não houve por ser dia de greve. Fui à urgência e só sai de lá com a Tac na mão e uma conversa com o chefe das urgências para me explicar o que tinha. Era maligno, foi só o que soube ou consegui ouvir.

Agosto de 2016
Referenciada para o IPO, tive a primeira consulta dia 3 de Agosto, mas aí já sabia muito da minha doença - cancro na hipofaringe, metastisado para os gânglios, traqueia, esófago e mediastino - não pelo que os médicos me explicaram mas pelo que procurei de informação. Agosto arrastou-se, lento e longo, todos de férias e eu de cancro. Exames às pinguinhas, todas as semanas. Nunca úouve uma resposta, uma explicação, um apoio. Só, completamente só com a angustia de ter um cancro e ao que eu adivinhava em estado já muito avançado. No final do mês a suposta consulta de grupo, onde me disseram que não podiam propor tratamento porque ainda precisavam de uma Tac ao Tórax e uma Pet. Esses exames paguei-os eu porque seriam semanas de espera. Querem saber o que senti no IPO? Esta está quase a morrer não vale a pena gastar muito com ela.

Setembro de 2016
Proposta terapêutica: cuidados paliativos, diminuir ou retardar o aparecimento de sintomas. Talvez nem um ano de vida. A minha vida acabou ali, uma desesperança sem nome. Uma solidão sem tamanho.

Outubro de 2016
Através de uma enfermeira amiga soube de um oncologista, aqui no Alentejo, e ela consegue-me uma consulta. Ele 'agarrou-me', disse-me que eu estava a morrer e que tínhamos de tratar de mim. Não tem cura, disse (e eu sabia que não, sei que não) mas poderá viver com o cancro não se sabe quanto tempo, é possível. Passada a primeira semana do primeiro ciclo de químio voltei a ter um pouco de mim outra vez. Voltei a ser eu novamente. Nada será como dantes - vivo todos os dias com a sombra da minha morte - o meu cancro não tem cura, estadio IVc. Mas também acredito em milagres, e no amor. Muitos amigos e familiares desapareceram, outros surgiram ou reapareceram. Tenho alguns anjos da guarda que comigo tentam que eu possa continuar a viver. E eu quero é viver!!!!

Neste momento terminei 4 ciclos de quimio e aguardo fazer nova PET para vermos como respondeu o tumor. Mas pelo que passei, completamente intoxicada, tenho serias duvidas em voltar a fazer quimio, muito menos radio. Se não o tivesse feito talvez não estivesse aqui agora mas viver assim, ou melhor, estar viva, só, hum...há muito a reflectir ainda. Já muita coisa mudou desde que escrevi este texto (7 meses depois), principalmente a forma como vejo a vida  e que espero vir a partilhar com vocês.

Paula